Para quem fazia violinos, violas e violoncelos há 300 anos, é incrível que Antonio Stradivari continue insuperável até hoje. Dos quase 1100 instrumentos feitos por ele, pouco mais de 600 chegaram aos nossos dias: são conhecidos como Stradivarius, a versão latinizada do nome do mestre. As peças mais cobiçadas são aquelas fabricadas no chamado “período de ouro” de Stradivari, entre 1700 e 1720.
O célebre luthier (fabricante de instrumentos de corda com caixa de ressonância) nasceu em Cremona, no norte da Itália, por volta de 1644. Antes dele, a cidade já abrigava artesãos conhecidos por fazer os melhores violinos do mundo: o mais antigo desses instrumentos que chegou aos nossos dias foi confeccionado pelo cremonês Andrea Amati em 1564. A técnica era passada de pai para filho e, por quatro gerações, os Amati fizeram grandes instrumentos. O trabalho deles foi ofuscado pelo surgimento de Stradivari. O primeiro Stradivarius de que se tem notícia foi feito em 1666. O artesão viveu até os 93 anos, controlando seu negócio com mão de ferro. Não se preocupou em formar os filhos, e muitos de seus segredos de fabricação morreram com ele.
Os Stradivarius são os instrumentos musicais mais caros do mundo – o recorde em vendas públicas pertence ao violino chamado Christian Hammer, arrematado em Nova York em maio 2006 por 3,54 milhões de dólares (em negociações particulares, os preços podem ir ainda mais alto). Eles são primorosos tanto pela sonoridade magnífica quanto pela forma perfeita. “Um Stradivarius é uma obra de arte, como um quadro. É diferente de qualquer outro violino”, afirma o empresário e músico amador Geraldo Modern, de 93 anos. Alemão, ele vive no Brasil desde 1934 e foi um dos poucos a possuir um Stradivarius por aqui – o dele, já revendido, era de 1709.
Violinos foram modificados, mas mantêm a excelência do fabricante
A principal façanha de Stradivari está na chamada “projeção sonora”: o som de seus violinos alcança facilmente o fundo das salas de concerto. A responsável por isso é a caixa de ressonância, que serve como amplificador: o luthier cremonês inovou ao deixá-la mais plana, quase eliminando a curvatura do tampo e do fundo. Entretanto, como todos os violinos de sua época, os Stradivarius também tiveram que ser adaptados às necessidades dos concertistas contemporâneos – que exigem ainda mais projeção sonora. Assim, os violinos do mestre usados em apresentações tiveram o braço inclinado para trás e deixado paralelo às cordas. Outra mudança foi nas barras harmônicas, substituídas por modelos mais longos e fortes (para suportar a pressão das cordas, hoje mais tensas do que antes). Mesmo transformados, os Stradivarius mantêm seus traços originais inconfundíveis.
Fundo
Há quem diga que o segredo dos violinos do período de ouro do mestre está nas peças de bordo usadas para fazer o fundo das caixas de ressonância. A madeira teria sido embebida em água salgada (de propósito ou por acidente), o que as teria tornado exepcionalmente duráveis.
Etiqueta
Visível através da abertura acústica esquerda, indicava, em latim, o fabricante, a cidade dele e o ano de fabricação. Assim, um Stradivarius feito em 1700 traria a inscrição “Antonius Stradivarius Cremonensis Faciebat Anno 1700”. Para fingir que tinham obras do mestre, comerciantes imitavam essas etiquetas.
Voluta
A voluta serve, basicamente, para pendurar o violino. Assim como as aberturas acústicas, as volutas de Stradivari são magníficos trabalhos de marcenaria. Aparentemente, elas revelam um certo conhecimento matemático, pois lembram os princípios do traçado de espirais descobertos pelo filósofo grego Arquimedes.
Verniz
A receita especial que Stradivari usou para envernizar seus instrumentos permanece desconhecida. No início, ele aplicava o verniz amarelado comum em Cremona. Depois, mudou para um tom vermelho. É possível que esse verniz ajude na sonoridade, mas até hoje não se pôde comprovar como isso acontece.
Aberturas acústicas
Seu formato segue proporções áureas. São estreitas, removendo pouca madeira do tampo. Acabamentos circulares nas pontas evitam que surjam rachaduras. As aberturas estão entre os principais traços analisados por especialistas na hora de distinguir um Stradivarius de uma cópia.
Tampo
Feito de madeira macia, vibra junto com as cordas. Os tampos de Stradivari eram montados a partir de duas peças coladas, tiradas do tronco da árvore como se fossem fatias de bolo. É o chamado “corte radial”, que garante o equilíbrio entre graves e agudos.